Amo, ó pálida beleza, tuas sobrancelhas arcos
Parecem verter noturnos
Teus olhos, embora muito-negros, me inspiram fatos
Nem sempre soturnos.
Teus olhos, que ao teu negro cabelo se combina,
A crina elástica,
Teus olhos, langues, me dizem na retina:
“Se queres amante da musa plástica,
Confiança na fé que em ti excitamos,
E nos sabores que professas,
Poderás constatar o que afirmamos
Do umbigo às nádegas confessas;
Verás no bico desses belos seios carnudos,
Dois vastos medalhões de bronze,
Sob um ventre sereno como o veludo,
Castanho-escuro como pele de monge;
Um rico tosão que é o gêmeo, na verdade,
Dessa outra enorme crina
Ágil e frisada, e que te iguala em densidade,
Noite sem astros, noite em surdina.”
[Tradução. Jacineide Travassos]
*
Les Promesses D’un Visage
J'aime, 0 pâle beauté, tes sourcils surbaissés
D'où semblent couler des ténèbres
Tes yeux, quoique très noirs, m'inspirent des pensées
Qui ne sont pas du tout funèbres
Tes yeux, qui sont d'accord avec tes noirs cheveux
Avec ta crinière élastique
Tes yeux, languissamment me disent: «Si tu veux
Amant de la muse plastique
Suivre l'espoir qu'en lui nous avons excité
Et tous les goûts que tu professes
Tu pourras constater notre véracité
Depuis le nombril jusqu'aux fesses
Tu trouveras au bout de deux beaux seins bien lourds
Deux larges médailles de bronze
Sous un ventre uni, doux comme du velours
Bistré comme la peau d'un bonze
Une épaisse toison qui, vraiment, est la sœur
De cette énorme chevelure
Souple et frisée, et qui t’égale en épaisseur
Nuit sans étoiles, Nuit obscure. »
[Charles Baudelaire]
J'aime, 0 pâle beauté, tes sourcils surbaissés
D'où semblent couler des ténèbres
Tes yeux, quoique très noirs, m'inspirent des pensées
Qui ne sont pas du tout funèbres
Tes yeux, qui sont d'accord avec tes noirs cheveux
Avec ta crinière élastique
Tes yeux, languissamment me disent: «Si tu veux
Amant de la muse plastique
Suivre l'espoir qu'en lui nous avons excité
Et tous les goûts que tu professes
Tu pourras constater notre véracité
Depuis le nombril jusqu'aux fesses
Tu trouveras au bout de deux beaux seins bien lourds
Deux larges médailles de bronze
Sous un ventre uni, doux comme du velours
Bistré comme la peau d'un bonze
Une épaisse toison qui, vraiment, est la sœur
De cette énorme chevelure
Souple et frisée, et qui t’égale en épaisseur
Nuit sans étoiles, Nuit obscure. »
[Charles Baudelaire]
Minha tradução tem como texto-base a edição de Cluny (Paris,1936), a mesma manuseada por Ivan Junqueira na edição bilíngüe de 'Les Fleurs du Mal' lançada pela Nova Fronteira. Consultei ainda o texto de José Paulo Paes – que consta no livro Poesia Erótica (Ed. Companhia das Letras) – traduzido de Les Epavés (seção final de Les Fleurs du Mal, Paris, Libraire Mirelle Ceni, 1963.
Os tradutores citados, lamentavelmente, priorizam os cânones rímicos e rítmicos relegando, quase sempre, a segundo plano o aspecto imagético. Ambos ao supervalorizá-los os esquecem como parte da “poética” (agenciamento estrutural-semântico do texto). Não se pode negar que como bom simbolista, o “métier poétique” baudelairiano centra-se na musicalidade sem jamais prescindir das sinestesias (jogos de sentidos enquanto rede de percepções físicas, correspondências entre a visão, audição, tato, olfato, paladar) e do cromatismo (sugestão de cores); onde o EU dilui-se na materialidade da linguagem e do cosmos. Busquei uma fidelidade maior ao texto em sua totalidade.
*Tradução publicada no Jornal do Commercio (PE).
Os tradutores citados, lamentavelmente, priorizam os cânones rímicos e rítmicos relegando, quase sempre, a segundo plano o aspecto imagético. Ambos ao supervalorizá-los os esquecem como parte da “poética” (agenciamento estrutural-semântico do texto). Não se pode negar que como bom simbolista, o “métier poétique” baudelairiano centra-se na musicalidade sem jamais prescindir das sinestesias (jogos de sentidos enquanto rede de percepções físicas, correspondências entre a visão, audição, tato, olfato, paladar) e do cromatismo (sugestão de cores); onde o EU dilui-se na materialidade da linguagem e do cosmos. Busquei uma fidelidade maior ao texto em sua totalidade.
*Tradução publicada no Jornal do Commercio (PE).