sexta-feira, fevereiro 17, 2012

Há Uma Mulher

Alessandro Marziano














Há uma mulher que desenrola os seus cabelos nas sílabas
e perfuma-as com o odor da sua lenta vulva
Ela tanto pode ser uma fêmea da lua como uma rapariga solar
Nas suas ancas ondula um indolente outono e nos seus seios desponta a primavera
Eu vejo-a e não a vejo na brancura da página
porque ela flutua vagamente na distância como uma lua no meio-dia
Mares bosques clareiras fontes em delicadas e delgadas linhas
fluem com o fulgor dessa mulher azul
As palavras caminham com o ritmo fresco dos seus pés descalços
sobre uma praia fulva de conchinhas brancas
O seu hálito doce embriaga as leves sílabas
e a doçura do seu lábio impregna as frases nuas
Ela é a presença ausente corpo da aragem viva
e a sua felicidade é tão vaga como vaga a sua longínqua imagem.

António Ramos Rosa
'Génese seguido de constelações'
Lisboa, Editora Roma, 2005