domingo, fevereiro 19, 2012

Carnavalização - Carne, Arte, Palavra

Kara Walker








A carnavalização dos textos se confunde com o que se convencionou denominar de polifonia discursiva; para distinguir a multiplicidade de vozes, de certos textos, do dialogismo constitutivo de todo discurso.

O teórico russo Bakhtin desenvolve a questão da literatura carnavalesca principalmente ao descrever as festas medievais na obra de Rabelais. Tais festas são consideradas como"segunda vida" do povo, pois ofereciam uma visão do mundo, do homem e das relações humanas totalmente diferente, deliberadamente não-oficial, exterior à igreja e ao Estado; parecia terem construído ao lado do mundo oficial, um segundo mundo e uma segunda vida, a que os homens da Idade Média pertenciam em maior ou menor proporção e em que viviam em datas determinadas. Isso criava uma espécie de dualidade do mundo...

Em outras palavras, com a festa o mundo era colocado do avesso, vivia-se uma vida ao contrário, pela suspensão das leis, das proibições e das restrições da vida normal, invertia-se a ordem hierárquica e desaparecia o medo resultante das desigualdades sociais, acabava-se a veneração, a piedade, a etiqueta, aboliam-se a distância entre os homens, instalava-se uma nova forma de relações humanas, renovava-se o mundo. A festa que mais plenamente assumiu essa renovação universal foi o carnaval.

O conceito de ambiguidade, de duplicidade, de ambivalência, enfim, é por conseguinte, essencial para que se compreenda a carnavalização bakhtiniana. Sobre a visão carnavalesca do mundo se assenta, para o autor, uma cultura carnavalesca de que decorrem grandes obras, como as de Cervantes ou Dostoiévski ou o picaresco em geral. Só como exemplo, não podemos esquecer que Cervantes tirou a máscara do Cavaleiro medieval e foi lutar com moinhos de vento...O avesso do herói imbatível...Aí está o homem e o herói ou anti-herói moderno.

No quadro de uma teoria semiótica do discurso se estende a noção de ambivalência à duplicidade dialógica de cada nível de descrição do texto, na caracterização dos discursos poéticos. Os discursos literários se caracterizam, em resumo, pela ambivalência intertextual interna que, graças à multiplicidade de vozes e de leituras, substitui a "verdade universal", única e peremptória pelo diálogo  de "verdades" textuais (contextuais) e históricas.

Evoé Baco! Evoé Vênus! Evoé Momo! Evoé Bakhtin!