domingo, abril 10, 2011

A Poesia Gerada no Movimento dos Ventos
















*Por Amador Ribeiro Neto


O vago, o disperso, o efêmero,o vazio, o intangível, o instável, o volúvel, o indefinido,o transitório, o passageiro constituem a matéria eólia de Livro dos Ventos, estreia de Jacineide Travassos, pernambucana de Carpina, na poesia. Mas sua trajetória é marcada pela participação nas mais conceituadas revistas impressas e eletrônicas, além de prestigiadas antologias.
Sua estreia aponta para um dos fatores mais instigantes da saga dos novos poetas: vencida a influência avassaladora da Semana de Arte Moderna (naquilo que esta trouxe de mais assimilável e facilmente descartável) e que encontrou eco na divulgação igualmente devastadora e diluidora da Literatura Beat, esta nova geração tem-se caracterizado pela diversidade. Não uma diversidade do acaso, mas uma diversidade que encontra na história da poesia, o trampolim necessário.
Jacineide Travassos, bacharel em Crítica Literária pela UFPE, mestra em Teoria Literária pela UFPE/USP e atualmente doutoranda em Literatura e Cultura: Estudos Comparados, na nossa UFPB, já pelo currículo deixa ver que Literatura para ela é matéria ontológica, antes de ser ficção ou poesia. Talvez por isto tenha levado tanto tempo até publicar seu primeiro livro.
Mas foi muito bom este tempo de espera. Com ele veio a maturidade poética. E Livro dos Ventos tem uma visada simbolista, de viés rimbaudiano e cruzeano que só acrescentam qualidades ao livro.
As imagens voláteis de cada poema advêm da irrestrita liberdade rimbaudiana e do branco inconsútil de Cruz e Sousa. No cruzamento destes dois grandes poetas há uma revoada de pássaros, asas e ventos. Daí nasce o livro num vaivém de movimentos sublimes. O sublime é sua clave mestra. Um sublime que, se nos escapa por entre os vãos dos dedos das mãos, fixa-se, por outro lado, em nossa memória sensível, de tal modo que,ao findarmos a leitura o livro já se encontra incrustado em nosso ser.
De fato o percurso do vento move o livro, indo da "Pequena História do Nascimento do Mundo", breve poema em prosa que já registra a marca poética desta poeta de tantos encantos e suavidades.Veja este exemplo: "o vento vivendo na casa / cavalo branco crina d'aurora /galopa rosa o verde dos limões / acorda galos / canta nas árvores o que há de folha se pássaros".
As filigranas desta miríade de variações de vento e cor, num carrossel de aliterações da consoante /v/ e de rimas toantes internas (aquelas rimas em que se considera apenas a vogal tônica e que rimam dentro do próprio verso) vEnto vivEndo;cAsa cavAlo brAnco gAlos cAnta Árvores hÁ pÁssaros; acOrda aurOra galOpa rOsa limÕes fOlhas),criam o mundo de novo.
O conhecido, o sabido, o experienciado têm cara de novidade novinha em folha. Velhas sabedorias, velhos sentimentos, velhos comportamentos alcançam dimensões até então inimagináveis. E o leitor se surpreende, grato, a cada imagem de cada poema do Livro dos Ventos.


Fonte: Correio da Artes. João Pessoa, fevereiro/ 2010 – ano LXI – número 2.


*Amador Ribeiro Neto é poeta, crítico literário, semioticista e colunista da revista Cronópios. Paulista, radicado na Paraíba e professor da UFPB.